Adolescencia - parte II

 

PARTE II

Me lembro que ali no Colégio Claretiano quando eu fiz da 6ª a 8ª séries no período vespertino, as aulas terminavam as 17 horas e nós ficávamos até as 18 horas no pátio ao lado da Igreja, jogando queimada. Nos meses do outono quando a noite chegava mais cedo, a gente quase não via mais a bola de borracha que usávamos, que era pesada e marcava os coleguinhas ao acertarmos em cada um dos queimados. Foram tempos muito bons.

Com a adolescência chegando e eu me tornando mocinha, me lembro que as coleguinhas já usavam soutien, mas eu não tinha dinheiro pra comprar e não queria fazer feio com as colegas, então foi ai que pela primeira vez eu aprendi a fazer crochê. Minha avó me ensinou. E acreditem, eu fiz meu primeiro soutien. Ele era um amarelo ouro.  Muito bonitinho, mas como aquela era a única cor de linha que eu tinha em casa, então ele ficou muito chamativo, acabava aparecendo debaixo da blusa de uniforme branco.  O engraçado é que minha avó me ensinava, mas eu tinha vergonha de fazer perto da minha mãe e ela ou minhas irmãs me criticarem, então chegava da escola depois do banho e da janta eu ia logo para a cama e ficava fazendo crochê escondida. Até que mamãe viu e acabou achando bonitinho e me deu um colchete para fechar atrás.

Aprender crochê naquela época foi excelente para mim, porque hoje eu já morando sozinha aos 63 anos de idade, perto de aposentar, é o crochê que me faz companhia e não me deixa pirar com os pensamentos que vagueiam e acabam por construir dragões onde na verdade não existem. É uma verdadeira terapia.

E assim eu fui crescendo.

Assim que terminei a 8ª série, nós mudamos novamente. Desta vez não conseguimos ficar no bairro popular, que hoje virou centro de Goiânia. Fomos para o bairro mais próximo e que também dava acesso a pé. Pois naquela época ainda havia uma certa resistência aos transportes coletivos. Pouquíssimas pessoas usavam. Na verdade, acho que Goiânia ainda era muito pequena e esse era o verdadeiro motivo pelo qual as pessoas não usavam muito o transporte coletivo.

Me lembro que eu e a vovó na verdade só pegávamos ônibus quando íamos visitar os “parentes por afinidade” que moravam no jardim América. E pronto. O resto, como compras, padaria, aviamentos e outros, tudo era feito ou no centro ou no próprio bairro onde morávamos, que naquela época era o Setor Norte ferroviário. Era muito engraçado que hoje já existem os condomínios fechados e são muito chiques. Naquela época um dos prefeitos, fechou o setor ferroviário por um muro e nós que lá morávamos sentíamos excluídos da sociedade. Para ver como as coisas mudam.

Nesta época do Ferró, como chamávamos o bairro, fiz novas amizades. Participava de grupo de jovens e agora como uma verdadeira integrante. Meu irmão o Salviano (que hoje infelizmente já faleceu) ele foi por longa data o coordenador do grupo, e como coordenador nas missas ele na maioria das vezes era o comentarista. E no final, logo depois da comunhão ele deixava sempre uma leitura para que as pessoas saíssem pensativas e levassem para a vida aquela oração. Era sempre muito lindo.

Nesta época, foi o casamento da minha irmã mais velha, a Didi (Vera Lucia Rinaldes, que a partir do casamento passou a assinar também o sobrenome Oliveira) pois se casou com o Mamédio Bernardes Oliveira. E logo depois que ela casou nós mudamos do ferroviário para o setor Caiçara. Foram só 6 meses que moramos lá. Era péssimo, pelo menos para mim. A Didi casou e quase não vinha nos visitar porque ela passou a morar em uma chácara muito longe, perto do Campus Universitário da UFG-Go. O Totôe (meu irmão Geraldo Antônio, começou a morar com sua namorada que mais tarde se tornou sua primeira esposa e minha comadre, a Maria Noleto, meu irmão Salviano, tinha se mudado para Araguari, porque ao mesmo tempo que ele era uma carinha maravilhoso e fazia um bem enorme para o grupo de jovens, ele também era um carinha que se envolvia com facilidade com pessoas que não eram da melhor qualidade, e acabava se corrompendo se metendo em coisas não muito boas. Então quando minha mãe percebeu isso, tratou logo de pedir asilo na casa da minha tia Neném, para o Salviano morar com ela por um tempo, assim os amiguinhos dele o deixavam em paz. E foi assim que foi feito. Para ele foi muito bom porque neste momento de retorno para Araguari, ele reencontrou sua amiguinha de infância, a Rosa, e os dois começaram a namorar casaram e viveram juntos até o falecimento dele. Tiveram 3 filhos e várias netinhas. Acho que meu irmão foi feliz. Pelo menos é o que eu espero.

Assim que o Salviano se casou, e a Rosa ficou grávida, a Dodo (minha irmã Maria Augusta Rinaldes) foi para Araguari para morar com ele e ajudar a minha cunhada a cuidar do meu sobrinho Marco Túlio. A Rosa trabalhava no Quartel do Exército de Araguari, e não tinha muito tempo, além de não ter nenhuma experiência com criança, aí minha irmã que tinha suas amizades naquela cidade achou ótimo ir para morar com eles, e por lá ficou por muito tempo. Então na nossa casa só ficávamos eu, a mamãe e a vovó. De repente a família foi cada um para seu rumo.

O setor era muito ruim e longe de tudo. A mamãe também não se adaptou, fez uma compra de casa e não sei exatamente por que, mas teve que desistir da compra. E nós mudamos de volta para o setor Ferroviário, para uma casa novamente alugada. Agora na Avenida Z, hoje alongamento da Avenida Goiás. A casa hoje fica bem em frente ao terminal rodoviário de Goiânia.

Moramos nesta casa por mais alguns anos e de lá fomos mudar para a casa própria no conjunto Riviera, assim que o bairro foi inaugurado. Nesta época o dinheiro que a mamãe tinha recebido da casa de Araguari, já tinha ido todo embora. Primeiro ela comprou um carro (fusca branco, para a Didi ir para a faculdade e comprou uma lojinha de aviamentos “talismã” em sociedade com a Didi. Muitas vezes eu atendia na loja no período em que eu não estava na escola. No início a loja era em Campinas e depois mudou para Av. Contorno, onde hoje é o point das compras para os sacoleiros e compras bem em conta, perto da feira Hippie, a maior feira da América Latina. Mas naquela época o lucro era bem pequeno e o investimento parece que não foi tão grande assim. Outra parte do dinheiro foi para a festa de formatura de Ensino Médio da Dodô, que foi no Jóquei clube, com traje a rigor; ela vestiu um vestido laranja longo muito bonito, nunca vi outro igual, além de ter ganho um anel de ouro de formatura.

O resto do dinheiro com tantas percas, só deu para a mamãe comprar dois lotes no setor Palmito, um lugar muito íngreme e que jamais daria para ser construído. E assim o tempo foi passando até chegar a notícia de que os lotes tinham sido invadidos. Uma pessoa foi lá e invadiu exatamente no meio dos dois lotes. Deu o que fazer para reaver pelo menos o dinheiro de um dos lotes, mas nem sei como foi gasto, porque pouco tempo depois a mamãe foi chamada por uma cliente dela, a Dona Ninfa, para fazer umas costuras e chegando lá a mamãe ganhou desta nobre senhora o direito de retirar uma casa popular e poder pagar em pequenas parcelas. O marido desta senhora fazia trabalhos para o governo e ganhou algumas casas para oferecer para os seus. Deu uma para sua neta Paulinha e outra para minha mãe, assim seriamos vizinhas e por tabela, mamãe ficava de olho na netinha da dona Ninfa, pois esta, era uma menina hippie e não gostava de dar satisfações a família. E assim a mamãe pode nos acomodar todos. Porque aos finais de semana ou pelo menos nas datas comemorativas a família se reunia, e os netos iam chegando e agregando. Só eu que, mesmo tendo me casado, nunca sai de lá, e estive sempre perto da minha mãe e avó.

Quanto ao Totôe, não me lembro dele ter ganho nada com a venda da casa de Araguari, a única coisa que pode aproveitar pelo tempo que lhe foi permitido foi de ficar perto da mamãe quando ele também se aposentou, pois aí já tinha se separado da Noleto e casado com a Regina, e tiveram uma linda princesa chamada Isadora. Por longa data eles moraram no barracão do fundo, onde tinha sido construído para mim, quando eu me casei com o Nilton.

Logo depois que eu me casei e passei a morar no barracão, a mamãe e a vovó moraram na casa da frente até o falecimento da minha avó. Nesta data meus filhos Alejandro e Francis Muller eram bem pequenos e a mamãe não me deixou voltar para o barracão, pois disse que jamais viveria sozinha naquela casa gigante. Assim foi feito! Com o falecimento da vovozinha nós ficamos direto na casa da mamãe. E lá os meninos cresceram, e meu casamento acabou. Aí que eu não voltaria mesmo, para o barraco, pois agora éramos duas mulheres e duas crianças. Mas nesse momento a Dodô que também já tinha se casado resolveu voltar para a casa trazendo seu esposo.

Não foi nada legal, mas uma coisa muito clara sempre esteve na minha cabeça era que a casa nunca tinha sido minha. Então as regras também não eram.

Ah, não posso esquecer de dizer sobre o Salviano, que também o único pedacinho que aproveitou daquela casa foi quando teve que voltar às pressas do Ceará para onde tinha se mudado com a Rosa e o Marco Tulio, por isso a Dodô teve que vir embora.  O Ceará que é uma terra extremamente seca, resolveu inundar quando o Salviano foi morar lá. Eles moraram em Limoeiro do Norte, e uma enchente atingiu o município, e a população teve que se retirar. Engraçado que os retirantes das secas do sertão agora eram retirantes das enchentes. Então não queriam voltar para Araguari. Até porque meu irmão que já tinha aprendido a fazer coisas feias, acabou fazendo sujeiras no ambiente de trabalho no banco ao qual ele trabalhava. Então a mamãe mandou dinheiro e eles vieram para a casa dela de mudança. A Patrícia tinha acabado de nascer.

 Salviano tinha um pai com o mesmo nome dele, e este morava lá em Araguari. Meu irmão o procurou para cobrar o que lhe era de direito, mas não teve nem o afeto desejado. Ficou muito desolado, decepcionado, e assim resolveu ignorá-lo também, na mesma moeda. Mas foi bem doído para ele.

Eu e ele crescemos ouvindo todos os dias que éramos quase que agregados, que a nossa mãe era mais mãe dos outros que nossa, que nós não tínhamos nenhum direito a nada. Então vivíamos meio que de implorar um pouquinho de afeto. Mesmo assim fomos felizes dentro do que nos coube.

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