Revogação de Alforrias

Segundo Keila Grinberg em seu texto: Reescravização, Direitos e Justiças no Brasil do Século XIX, falando sobre as revogações de alforrias, ela conta sobre um casal de escravos: Martha e sabino, que sendo escravos do Sr. João Vaz da Silva, que os herdou de seus pais. João vivia com a esposa, os filhos e os dois escravos. Tinha ainda o Conrrado “idiota coitado” que não era contado. Os Escravos viveram cativos até o fim da vida de João . Quando só aí ele libertou Sabino e alforriou Martha, mas esta só seria livre com a morte de seu Senhor. Com a morte de João, Martha ainda permaneceu por um tempo na casa, auxiliando sua ex senhora, mas, partiu logo depois, desgostosa das interferências em sua vida. Martha mudou-se para a casa de Manoel Rodrigues Viana, mas sendo muito procurada e importunada pelos filhos de João, achou por bem mudar-se para além do Rio das Velhas. Passados seis (6) anos, resolveu volta junto com Sabino. E aí foi apreendida pelos filhos de João que os queriam de volta como escravos. A alegação dos filhos era que o pai, tendo mais de 80 anos, já não gozava de suas faculdades mentais, como antes. Pediram a justiça as anulações das alforrias, e que os dois fossem declarados em condição servil. Diziam: “a velhice é uma enfermidade gravíssima e perpétua” , que atingia a todos maiores de 70 anos; conforme rezava o Parágrafo 5, título 104. Livro 4, das Ordenações Afonsinas. Portanto ao libertar seus escravos não dispunha de capacidade para exercer ato civil ou judicial, ou até extrajudicial. Não podendo exercer seus direitos nem contrair obrigações valiosas, principalmente de dispor de TODOS os seus bens em prejuízo da mulher e dos filhos. O CURADOR alegou que seus clientes baseavam no “direito social e natural” e nem adiantava Martha e Sabino denunciá-los por ambição e desumanidade. Nem mesmo pedindo provas das imperfeições mentais de João. Ou que como já havia se passado 6 anos de liberdade e qualquer ação de escravidão já estaria prescrita. O juiz entendeu que as cartas deveriam ser prescritas, alegando direitos adquiridos pelos herdeiros. Isso, em pleno século das Luzes (sec. XIX). A historiografia vem se dedicando a analisar esse processo, impetrados por escravos. Temos: Sidney Chalhoub; Hebe Mattos; Eduardo Spiller Pena; Elciene Azevedo e Joseli Mendonça. A revogação da alforria pode acontecer quando da escravização ilegal de descendentes de indígenas, de libertos ou de africanos chegados no Brasil após a lei de 1831, que proibia o tráfico atlântico de escravos. Segundo Judy Bieber o fim do trafico negreiro, acabou por fomentar práticas de reescravização de libertos, com o objetivo de dar conta da demanda por escravos na região do Vale do Paraíba. Casos de pessoas que já haviam conseguido a alforria em regiões como Minas Gerais e Goiás, mas foram escravizadas e vendidas para o sul, até mesmo com a participação de autoridades municipais. Muitos casos de revogação da Alforria leva a discussões dos casos das leis sobre os escravos e tornam essa pratica cada vez menos legítimas, tendo como ponto, avaliar as práticas da reescravização e manutenção da liberdade, julgada pelas cortes de apelação do Rio de Janeiro, conseguindo a crescente perda de legitimidade. A intenção é chamar a atenção para os casos a partir da ótica do direito. A classificação desses motivos ficaram da seguinte forma: * carta de alforria 31% – quando os escravos argumentam que os senhores ou seus herdeiros lhes haviam concedido alforria e depois voltado atrás. * ventre livre 11% – quando as famílias de escravos argumentam ser filhos, netos ou bisnetos de pessoas ilegalmente escravizadas, fosse por serem libertas, fosse por terem origem indígena. * compra de alforrias 13% – quando os escravos ou terceiros pediam arbitrariamente de seu valor para apresentar pecúlio. Essas ações foram consideradas um conjunto único e classificadas por mim segundo o “tipo” de argumento que envolviam. * Violência e prostituição 4%. * Tráfico 3%. • Escravidão e manutenção de liberdade 27%. • Outros 11%. • Demais ações 73%. Indivíduos cativos solicitam a homens livres que assinassem petições por eles; argumentando razões suficientes para processar o Senhor. Os casos tratavam de discutir medidas possíveis para reaver a doação de liberdade. O momento era de passagem de liberdade para escravidão e não ao contrário. As ações de escravidão eram iniciadas por senhores que queriam reaver seus escravos. Desta forma foi possível demonstrar o quão instável era a vida dos escravos. De 1808 a 1830 – as ações de reescravização eram de 5%; de 1831 a 1850 subiram para 25%; e de 1851 a 1870 chega a 65%; só vindo a baixar de 1871 a 1888 chegando a 20%, isso conforme dados estatísticos do Tribunal da Relação - Arquivo Nacional do Rio de Janeiro. Esses processos levantavam questões sobre a justiça oitocentista, afinal só tinham eficácia se fossem aprovados pelos juízes. Os juízes fundavam-se segundo Linine Nequete no alvará de 10 de março de 1682, que reprimiu com medidas contra os quilombolas de Palmares, o Alvará estabelecia que aquele escravo antes de ir para o quilombo deveria voltar a escravidão, caso fosse exigido até um prazo de 5 anos. Segundo Naquete, só a partir desta data, se conheceu caso de revisão causa, dando a ROSALINA FERNANDES DE ALMEIDA e seus filhos menores, alegando que ela viva como livre, em virtude da prescrição de cinco anos, decretada no parágrafo 5. A liberdade do índio é estratégica, tem intuito de catequizá-lo na fé católica. Missão de liberdade que só se conseguirá se o índio for catequizado. Quanto ao escravo fugido, mesmo passando 5 ou quanto anos fossem (conforme a legislação romana, onde os imperadores Justino e ou Maximiano, estabeleceu prazo de 10 ou 20 anos de posse contínua da liberdade) como prescrição da escravidão. Isso quando o escravo não ingressava em um mosteiro. Mas alguns casos foram revistos e dado aos escravos a liberdade, como no caso de SEBASTIANA, nascida antes da promulgação da lei 1871, sua mãe ANASTÁCIA, fora matriculada com a nota de fugida, mas seus filhos, que provavelmente tinham nascido após a lei do ventre livre e desta forma o juiz considerou o pedido procedente, em corte de Apelação do Maranhão, alegando nulidade manifesta e injustiça notória. O jornal GAZETA JURÍDICA, já se manifestava e publicou de 1879, manifestando sua indignação contra o que considerava uma intromissão imprópria do supremo Tribunal de Justiça na propriedade alheia. O redator da Gazeta Jurídica parece ter tocado no ponto fundamental da discussão: saber até que ponto poderia ir a jurisprudência sobre o assunto. Ou melhor a real preocupação do redator era identificar que efeitos ela provocaria. Lázara Alzira de Freitas

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